João Calvino 500 anos: introdução ao seu pensamento e obra.
Compreensão e Avaliação
Por
Jailson Santos
COSTA, Hermisten Maia Pereira da. João Calvino 500 anos: introdução ao
seu pensamento e obra. São Paulo: Cultura Cristã, c2009. 399
Durante os últimos séculos, tanto do ponto
de vista teológico, como do ponto de vista literário, nenhuma pensamento
contribuiu com igual clareza e igual força para o desenvolvimento das
sociedades como o pensamento de Calvino, o qual, ao longo da história
tem alcançado gerações. Nos últimos anos as “Institutas” (sua principal obra)
têm sido o livro texto de muitas instituições religiosas. Varias edições latinas e francesas, e numerosas traduções em
línguas estrangeiras foram dadas ao público durante sua vida e continuaram a
ser após a sua morte. Nas palavras de Gouvêa, não é exagero afirmar que
a historia da teologia pode ser dividida em pré-Calvinista e pós-Calvinista.[1]
Fruto desse desenvolvimento do pensamento calvinista que chega as nossas
mãos o livro “João Calvino 500 anos: introdução ao seu pensamento e obra” do
Dr. Hermisten Maia. O presente livro é uma obra para acadêmicos e leigos que
desejam conhecer a vida e a obra deste grande reformador genebrino de maneira
clara, profunda e, como é comum nos demais livros do autor, com uma rica fonte
bibliográfica. A proposta principal da obra é destacar alguns temas do
pensamento de João Calvino, o qual, segundo o autor, nada mais são que fruto de
sua exposição bíblica. Nesse sentido, a presente obra nada mais é se não uma
breve e profunda exposição de pontos específicos e autônomos da vida e obra de
Calvino coexistida em uma unidade coerente.
O Dr. Hermisten Maia é de formação reformada calvinista. Doutor em
Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo (2003) e com
vasta experiência na área de História, com ênfase em História da Reforma
Protestante, este estimado teólogo tem dedicado sua vida ao estudo da vida e
obra de João Calvino, Reforma Protestante e Teologia Sistemática. O texto
apresentado pelo autor é fruto de anos de pesquisa feita na academia e das
inúmeras aulas ministradas sobre o assunto ao longo de sua vida.
A obra é divida em duas partes com um total de dez capítulos, os quais
trazem uma análise histórica e teológica vários aspectos da vida e obra do
reformador, no seu exercício ministerial na cidade, seu ofício pastoral na
igreja e sua vida como teólogo acadêmico. Na primeira parte o autor discorre
sobre “a reforma protestante e o surgimento do reformador”. A presente obra é
uma síntese sistematizada da vida e obra de João Calvino, talvez o maior expoente
da Reforma Protestante e maior nome da teologia reformada.
A fim de contextualizar o reformador Genebrino na história secular e
eclesiástica, o autor aborda no primeiro capítulo a reforma protestante. Sobre
sua origem, Maia assevera que a reforma foi um período marcado pela pobreza
moral e espiritual da igreja, de modo especial no clero. No que se refere à
história secular a reforma é marcada pela efervescência do Renascentismo e do
Humanismo. O autor aborda ainda a Reforma como movimento religioso e teológico,
atmosfera na qual Calvino se destaca como pensador influente. Destaca que apesar de ter alcance cultural e
social a reforma fora um movimento eminentemente religioso e teológico, o qual
não visava criar uma nova igreja, mas torna mais bíblica a existente. Sobre o a
reforma e humanismo-renascentista o autor lembra o leitor que a iluminismo teve
grande influência no pensamento dos reformadores, mas eles não foram sintéticos
em termos de valores cristãos e pagãos. Ele ressalta ainda o papel das Escrituras na
reforma. A Reforma fora um retorno as Escrituras, a qual se deu na mesma mão do
“livre exame” presente no iluminismo. Neste sentido houve um divorcio com a
tradição vista ao longo dos anos.
O capítulo dois relata o surgimento de Calvino como reformador. De início
o autor aborda a formação que Calvino recebera ao longo de sua juventude.
Destacam-se as universidades pelas quais ele passou e a transição dos estudos
da jurisprudência para a teologia. Em seguida o autor aborda a conversão do
reformador. Lembra-nos que não nos é possível precisar as circunstâncias e data
da “súbita conversão” de Calvino e que devemos estar atentos também para o fato
de que a vida de Calvino, mesmo antes da sua conversão, não fora marcada por um
comportamento dissoluto e imoral. Dr. Hermisten discorre também sobre a relação
entre o humanismo e o Calvino. Além de definir o humanismo e contextualizá-lo
historicamente, Maia traz suas principais características: (1) Restauração da
Cultura Clássica; (2) Criação do Novo; (3) Síntese do Cristianismo com a
Cultura Clássica; (4) Valorização do Homem: “O homem é a medida de todas as
coisas, da existência das que existem e da não existência das que não existem”.
Finalmente, Costa aborda Calvino: um humanista. Destaca que o reformador
genebrino fora um genuíno humanista e que isso é possível ser visto: 1) Seu
conhecimento humanista visto na sua analise filológica e literária apresentado
em sua primeira obra: “De Clementia”; 2) Sua amizade com pensadores humanistas
tais como Guillaume Budé, Corderius, Melchior Wolmar, dentre outros. 3) Em sua
objetividade desejada na alise bíblica e teológica bem como nas questões
cotidianas.
A segunda parte do livro é dedicada especialmente ao pensamento e vida
prática de João Calvino. No capítulo três, um dos mais extensos da obra, o
autor aborda o método hermenêutico de Calvino destacando sua crença inegociável
na suficiência das Escrituras em sua fé e prática pastoral. Principia falando
da origem, autoridade interna e suficiência das Escrituras. Destaca que Calvino
considerava as Escrituras como suficiente, que contem a verdadeira filosofia de
vida cristã. Mostra que ao longo da história esta suficiência tem sido atacada
por grupos, como por exemplo, espiritualistas e místicos.
Aborda ainda o relacionamento entre tradição e Escrituras e assevera que
a reforma trouxe um novo “eixo hermenêutico”, o qual deslocou a tradição da
igreja para compreensão pessoal o que levou muitos a levantar a bandeira de um
dos lemas da Reforma: “Sola Scriptura”. A razão da singularidade das Escrituras,
para Calvino, reside no fato dela ter sua origem divina e humana, isto é, ela
vem de Deus e foi registrada por meio de homens. Assim, o reformador defendia
que a igreja deve está sob a Escritura. Logo, “a pretensão da igreja de
subordinar a autoridade da Bíblia ao seu arbitro consiste em uma blasfêmia”
(COSTA, 2009, 76). Vida pessoal e coletiva deve ser pela Escritura.
O autor fala ainda de um dos mais conhecidos princípios hermenêuticos de
Calvino: acomodação da Palavra. Para Calvino Deus em sua Palavra “se acomodava
à nossa capacidade”, balbuciando sua Palavra a nós como as amas fazem com
criança. Citando Kuyper o autor lembra que a teologia nunca é “arquetípica”,
mas “éctipa”. Outro ponto levantado pelo Dr. Hermisten é que Calvino era um
discípulo das Escrituras na escola do Espírito. Seu conhecimento e visão do
mundo estavam submissos as Escrituras, pois todo conhecimento das ciências não
passa de fumaça separada da ciência celestial.
Costa destaca ainda que a teologia de Calvino é fruto do seu labor
exegético e pastoral de comentar em serie as Escrituras, o que fez de sua obra
uma “teologia bíblica” escrita por um teólogo sistemático. Calvino, como
humanista que era, era breve e claro em seus comentários. “Aprecio a brevidade”
diz Calvino (Apud COSTA, 2009, 99). Calvino também se preocupava em alcançar o
sentido original do texto e apresentá-lo de maneira simples e clara, o que lhe
deu o título de “o exegeta da reforma”.
Além de apresentar Calvino como um grande interprete, o autor o traz como
um grande pastor que entendia que o conhecimento era para vida. Por essa razão,
as últimas páginas do capítulo são dedicadas a responsabilidades dos pastores.
Neste sentido alguns princípios pastorais são destacados: a) Deus vocaciona
seus pastores para seu serviço santo; b) Deus usa seus ministros, os quais são
escolhidos por graça, a fim de serem fiéis as Escrituras, para com autoridade
ensinarem as Escritura para a vida. O autor encerra o capítulo com uma palavra
aos ministros e fieis onde são abordados princípios como: a) humildade; b)
exame criterioso; c) a manutenção dos ministros.
O capítulo quatro apresenta a
visão de Calvino a respeito da doutrina da eleição. O autor assevera que esta
doutrina é amplamente ensinada nas Escrituras, fazendo parte dos ensinamentos
de Jesus e dos apóstolos e que como eles Calvino a ensinou de maneira
especulativa, árida e abstrata, mas sobre tudo de maneira existencial. Em
seguida o autor apresenta algumas considerações gramaticais da ideia bíblica da
eleição tanto no Antigo Testamento como no Novo. Para isso apresenta o sentido
geral e teológico dos verbos “Bãhar” e “Eklégomai” que significam: “escolher”,
“eleger” e etc. Em seguida define a doutrina da eleição a Eleição é o ato eterno de Deus, por meio do qual, Ele decretou livre, soberana e
misericordiosamente salvar em Cristo Jesus um determinado número de homens da raça humana.
Em seguida apresenta pressupostos da doutrina da eleição: 1) a
depravação total do homem: O homem desde à Queda, encontra-se sob o
domínio do pecado e, por isso mesmo, é incapaz de responder positivamente ao
chamado externo do Evangelho. 2) Liberdade Soberana de Deus: O
Poder de Deus é Soberanamente livre; Deus não
tem primariamente compromissos com terceiros; 3) A Existência de um Plano
Divino: A escolha, feita na eternidade, denota a existência de um
plano, o qual Deus mesmo dirige para a execução da Sua vontade. 4) O
autor da eleição: O decreto da eleição é uma obra da Trindade, todavia,
a Bíblia atribui mais especificamente ao Pai este ato soberano.
Na sequencia o autor faz algumas considerações bíblico-teológicas sobre a
eleição de Deus: 1) É um Ato da Vontade Livre e Soberana de Deus: Deus nos elegeu
conforme a Sua sábia, amorosa e eterna vontade. A escolha de Deus não sofre
nenhum tipo de constrangimento no seu exercício. 2) É Eterna e Imutável:
Os propósitos de Deus são eternos não estão circunscritos ao tempo, à
aprendizagem e à “maturação das ideias”.
3)
É em Cristo: Cristo é o representante e o fiador eterno do Seu povo. A
eleição não ocorre fora da Pessoa de Cristo. 4) É Graciosa e Incondicional: A
eleição não é condicionada ou dependente de “boas obras” nossas,
nem de fé ou mesmo, de previsão
de fé, mas sim do beneplácito
de Deus. 5) É Irresistível: Deus exerce
a Sua influência sobre o homem eleito, quebrando a sua indisposição espiritual. 6) É Pessoal: Deus escolheu pessoas individualmente. 7) É
Perfeitamente Justa: Deus continuaria
sendo perfeito em Sua
justiça se não salvasse a ninguém.
Sobre a relação entre eleição e fé o autor afirma que “a eleição divina
é-nos totalmente estranha até que nos conscientizemos desta realidade pela fé”
(COSTA, 2009, 158). O autor destaca os propósitos da eleição: a) abençoador; b)
ético, o qual nos leva a uma vida de santa, irrepreensiva, de obediência e
serviço; c) Salvador; d) glorificador. Finalmente, o autor aborda as atitudes
que devemos ter diante desta doutrina: a) fé na verdade; b) serviço; c) amor
laborioso; d) humildade; e) santificação; f) amor a Deus; g) firme esperança em
Cristo; h) Bendizer a Deus com gratidão; i) certeza da vitória; J) proclamação;
k) promover a gloria de Deus;
No quinto capítulo o autor se atém a explicar a visão de Calvino sobre o
homem como imagem e semelhança de Deus. A pergunta a ser respondida é: Que é o
homem? A resposta a esta pergunta tem tido variações ao longo da história. Na
idade média a “fé” era a medida de todas as coisas. Na idade moderna o homem
passou a ser a medida de todas as coisas. Segundo o autor, dois movimentos
contribuíram para isso: a) o humanismo renascentista: "O homem pelo homem
para o homem"; foi lema tácito do Humanismo Renascentista. b) O
Iluminismo, o qual, em seu otimismo considerou a autonomia humana como o centro
de todo o seu pensar e agir. Em seguida o autor apresenta a perspectiva de
Calvino sobre o homem. Resalta que Calvino, como humanista que era, compartilha
da visão da grandeza do homem; no entanto, o seu ponto de partida é Deus. Em
síntese, podemos dizer que “o ‘humanismo’ de Calvino era um ‘humanismo
cristocêntrico’, caracterizando-se pela compreensão de que o homem encontra a
sua verdadeira essência no conhecimento de Deus” (COSTA, 2009, 203).
Outro ponto destacado pelo autor é o homem, criatura de Deus. Essa tese é
defendida por meio dos seguintes tópicos: a)
o lugar do homem na criação: O homem é a coroa da criação. Ela foi
direcionada para proporcionar ao homem a satisfação de suas necessidades e a
sua felicidade. b) o significado das palavras
“imagem” e “semelhança”. Antes de dizer o que é o autor apresenta não é: 1)
Não tem a ver simplesmente com o Físico; 2) Não consiste somente no domínio
sobre o mundo. Tendo dito o que não é Costa passa a afirma o que é “imagem” e
“semelhança”: a) Consiste em "Retidão" e "Verdadeira
Santidade"; b) Consiste de Imortalidade; c) Consiste de Inteligência,
Razão e Afeições. 3) O Fundamento Principal da Imagem está no “Coração” e na “Mente”: Calvino mostrar onde reside essa “retidão” e
“santidade”. Segundo ele, elas residem na mente e no coração, onde “retidão” e
“santidade” eram mais eminentes.
Em seguida o autor passa a abordar “imagem de deus após a queda” e mostra
que ela se tornou: 1) Imagem Desfigurada: Apesar de o pecado ter sido
devastador para o homem, Deus não apagou
a sua “imagem”; 2. Ignorância Espiritual: “após a sua rebelião, ficou privado
da verdadeira luz divina”; 3. Universalidade do Pecado: O pecado atingiu a
todos os homens. Seguindo, mesmo que de forma tácita, a tríade criação queda e
redenção o autor aborda a restauração da imagem e assevera que: a) O Ato de
Deus: fruto de sua graça; b) O Processo de Deus em Nós: Se dá por meio de
Espírito.
Costa finaliza o capítulo fazendo algumas implicações: 1) O Valor do
Homem: O homem deve ser respeitado, amado e ajudado porque é a imagem de Deus;
2) A Imagem de Deus e os Crentes: Nos eleitos, os da “família da fé”, Deus tem
renovado e restaurado por meio do Espírito a imagem de Deus; 3) O Amor ao
Próximo Como Uma Implicação da Imagem de Deus no Homem: “nosso amor deve ser
visivelmente estendido a toda a raça humana” (COSTA, 2009, 217). Logo, essa
doutrina deve nos conduzir a piedade.
O capítulo seis trata da espiritualidade de João Calvino analisando suas
ideias sobre oração, a qual, é indispensável a teologia. É digna de nota a
importância que o reformador genebrino deu a oração. Antes de ser um teólogo
Calvino fora um piedoso pastor. Costa lembra que a teologia de Calvino estava
relacionada com a vida prática. Para Calvino, “todo o pensar teológico está
conectado com a piedade. A teologia envolve toda a nossa mente, coração e
vontade” (COSTA, 2009, 226), logo, a doutrina é para ser crida, vivida e
ensinada. Destaca, também, a reverência humilde que Calvino tinha diante
da glória de Deus e sua consideração para com os salmos bíblicos, os quais ele
dizia ser a anatomia da alma. Grifa que a felicidade humana não se encontra no
aqui e agora, mas no lá e então. Destaca que a oração é um ato de elevar-se e
envolve reverência e se expressa no que pedimos.
Em seguida apresenta a oração como exercício de fé na providencia de
Deus. Na oração, revelamos a nossa fé em Deus e em seu providente cuidado. Orar
é entregar o futuro a Deus e por isso, é o melhor antídoto contra a ansiedade.
Nesse sentido orar é depositar tudo que temos e somos em Deus. Costa aborda em
seguida o conteúdo da oração, isto é, as promessas de Deus. Para o autor, as
promessas de Deus, conforme registradas na Palavra é o estímulo à prática da
oração. Lembra ainda, que a oração do Senhor é um modelo para todos os tempos.
Por meio dela aprendemos a suplicar o favor de Deus, buscar nele refúgio e
acima de tudo devotar a ele a glória devida. Finalmente, o autor trata da prática da
oração. Ela deve ser sistemática, constante e em todo tempo. Além disso, ela
não visa informar a Deus o que precisamos e mudar seus planos, mas transforma
nossas vidas e nos conduzir ao sentimento de dependência.
O capítulo sete aborda o culto ao Senhor dentro de uma perspectiva
calvinista. O autor abre o capítulo asseverando que fomos eleitos na eternidade
para adoramos a Deus e o culto é o momento mais sublime de nossa volta a Deus e
maior evidência de nossa saudade dele. Para maior entendimento do assunto o
autor traz o significado e o sentido de liturgia no âmbito gramatical,
histórico e teológico. Em seguida apresenta a perspectiva teocêntrica da
adoração calvinista onde destaca que o culto não visa satisfazer nossos desejos
pecaminosos, mas glorificar a Deus. E verdade que a adoração a Deus permite
adaptação cultural, todavia essa deverá sempre ser regulada pelos princípios
explícitos nas Escrituras, a palavra final do pensar, sentir e fazer. Além
disso, o autor apresenta os elementos essenciais do culto segundo Calvino:
Palavra; oferta e Santa Ceia. Sendo que todos eles deveriam se ministrados com
simplicidade.
Logo em seguida, o autor fala da visão de Calvino sobre a Ceia. Lembra a
compreensão de Calvino sobre este assunto é uma síntese do pensamento de Lutero
e Zuínglio, isto é, um sinal visível que representa uma realidade espiritual e
um meio de graça real. Traz ainda a visão dos calvinistas sobre o assunto
exposta nos catecismos de Wstminster e Heidelberg. Os últimos dois assuntos
tratados no capítulo são os cânticos e o culto como profissão de fé. Sobre o
primeiro, o autor destaca o aspecto didático da música e como ela fora usada na
fixação das Escrituras. Lembra a opção de Calvino de cantar, sem acompanhamento
de instrumentos, os salmos, v por entender que somente a Palavra é digna de ser
cantada. Dr. Hermisten, entretanto, assevera que “os hinos da igreja não
precisa estar limitados aos salmos, mesmo reconhecendo seu indiscutível
valor...” (COSTA, 2009, 313).
Finalmente, Costa aborda o culto como profissão de fé. Avulta que as
partes do culto devem ser expressão do que cremos, de acordo com a Bíblia. O
culto deve ser compreensível aos participantes a fim de que todos possam fazer
ressoar em seus lábios a oração de seu coração: “Amém!”. Por essa razão,
Calvino condenava a pompa artificial de qualquer cerimônia religiosa, pois o
culto não visa entreter o homem, mas sim agrada e glorificar a Deus. Sublinha,
por fim, que o culto a Deus é caracterizado pela submissão às Escrituras:
“nisto consiste a verdadeira adoração”. Sendo assim, reformado não deve “fazer
sincretismo teológicos e litúrgicos” (COSTA, 2009, 324).
O capítulo oito apresenta a importância da educação para a Reforma e para
Calvino. Destaca a forte ênfase dada a educação pelos reformadores e assevera que
por traz deste ardor pedagógico herdado da reforma estava um firme fundamento
teológico, uma vez que a educação visava preparar “o ser humano para melhor
servir a Deus na sociedade, a fim de que Deus fosse glorificado” (COSTA, 2009,
327). Essa realidade, entretanto, só era possível por meio de uma fé explícita.
Para Calvino o saber deveria gerar o fazer. Além disso, Costa aborda o conceito
de Graça Comum e suas implicações culturais. Lembra que Calvino dispunha de uma
visão ampla da cultura, entendendo que Deus é Senhor de todas as coisas; por
isso, toda verdade é verdade de Deus. Esta perspectiva amparava-se no conceito
da “Graça Comum”.
A fim de mostrar a importância de Calvino para educação, Costa discorre
sobre a Academia de Genebra: a missão e vocação. Sublinha o fato de que a base
da formação educacional em Genebra era a Bíblia. E que apesar da educação ser
competência da família e do Estado, a igreja tinha um papel especialíssimo.
“Por essa razão, os ministros da Palavra assumiriam a tarefa da educação nas
escolas elementares e nos colégios de Genebra”. A Academia tornou-se
grandemente respeitada em toda a Europa e fez de Genebra “um dos faróis do
Ocidente”. A fim de comprovar a tese supracitada, Costa apresenta dois dos
discípulos de Calvino e sua influência na educação mundial: John Knox e João
Amós Comênio. Sem dúvida, entre os Reformadores, Calvino foi quem mais
amplamente compreendeu a abrangência das implicações do evangelho nas diversas
facetas da vida humana de modo especial na educação.
No capítulo nove Costa trata da ética social de Calvino sublinhando o
trabalho que é visto como um esforço físico e intelectual. Para o maior
entendimento do assunto o autor traz um estudo etimológico da palavra trabalho
e suas principais características, entre elas a divisão social. Em seguida,
traz a contribuição de Lutero para uma nova perspectiva do trabalho ao traduzir
o Novo Testamento para o Alemão empregando a palavra beruf para trabalho ao invés arbeit.
Após esta contextualização, Costa apresenta a perspectiva de Calvino sobre o
assunto. Destaca que Calvino entendia que o trabalho é uma vocação e uma
oportunidade para servir a Deus e ao próximo. Em relação à ética do trabalho
lembra que Calvino defendia três princípios fundamentais: Trabalho, poupança e frugalidade.
Em seguida, costa apresenta alguns princípios presentes nas institutas,
concernentes ao uso dos bens concedidos por deus: 1) em tudo devemos contemplar
o criador, e dar-lhe graças: os recursos de que dispomos devem ser um estímulo
a sermos agradecidos a Deus; 2) usemos deste mundo como se não usássemos
dele: devemos viver neste mundo com moderação, sem colocar o coração nos bens
materiais; 3) suportemos a pobreza; usemos moderadamente da abundância: “tanto
sei estar humilhado, como também ser honrado...” Costa encerra o capítulo
asseverando que somos administradores dos bens de Deus. Todo que temos vem de
Deus e não pode se tornar um ídolo. Ao contrario o fruto do trabalho deve ser o
beneficio da sociedade. Além disso, as
pessoas devem ser avaliadas não pelo seu dinheiro, mas por sua piedade.
O último capítulo é uma breve análise da visão calvinista a respeito da
ciência. Para ele o divórcio entre fé e razão não tem motivos justos, pois “a
ciência começa sempre por um ato de fé; é impossível haver ciência sem fé”
(COSTA, 2009, 267). Tendo dito isto,
apresenta os tipos de conhecimentos e assevera que “a ciência não é o único
caminho para se chegar ao conhecimento e, na realidade, não pode esgotar o
real” (COSTA, 2009, 271). Além disso, afirma que a ciência caminha dentro da
dialética do saber - ignorância - saber
e que ela está comprometida com a compreensão do real, mesmo que este não lhe
pareça algo agradável ou digno; não cabe a ela escolher um “real ideal”.
Sublinha ainda que a ciência é em grande parte filha da necessidade e do
trabalho. Em seguida apresenta a Ciência e Religião no Pensamento Moderno e faz
uma análise histórica do relacionamento entre ciência e fé tendo como destaque
os pensadores Copérnico, Galileu e Newton. E conclui que enquanto que o
conhecimento humano é limitado, só alcançando um conhecimento científico das
coisas e suas relações através de um processo laborioso de pensamento
dialético, o conhecimento que Deus tem, é imediato e completo. O autor fecha a
sua obra refletindo a grande contribuição de Calvino na formação do homem
reformado.
O livro “João Calvino 500 anos: introdução ao seu pensamento e obra” do
Dr. Hermisten Maia é de grande valia para o entendimento histórico e teológico
da vida e obra de João Calvino. A leitura da obra foi bem produtiva, pois, de
maneira rápida e clara foi possível conhecer os principais aspectos da vida
deste grande reformador e acima de tudo as implicações práticas do seu
pensamento, na vida igreja reformada e do mundo contemporânea.
Por meio de uma acurada metodologia cientifica de pesquisa o autor aborda
o assunto proposto de forma didática e dentro de uma sequencia sistemática e
lógica, trata do tema com grande clareza demonstrando um vasto conhecimento do
assunto. Ele mostra que o calvinismo nascido há 500 anos não é apenas como um
conjunto de dogmas teológicos que teve influência no meio eclesiástico, mas que
tem sido antes de tudo, uma cosmovisão que foi desenvolvida a partir da doutrina
da soberania de Deus, e, que tem sido uma filosofia de vida que tem afetado a
sociedade e os indivíduos como um todo.
A grande contribuição da obra é apresentar a vida deste reformador
genebrino de maneira clara e concisa, o que a torna uma grande fonte de
consulta rápida. Este não é o único livro do assunto. Muitos são os autores que
tem escrito sobre este assunto. Todavia, a obra do Dr. Hermisten toma um
enfoque distinto ao apresentar em todos os capítulos inúmeras notas de rodapé,
o que conduz a leitor, sobre tudo se ele é um pesquisador, para um estudo mais
profundo dos temas abordados na presente obra.
Apesar ser um calvinista declarado e convicto, Dr. Hermisten demonstrou
neutralidade em sua análise história e teológica ao apresentar os fatos mais
que as interpretações. Ele não nega pontos fracos, os anseios e lutas deste
grande teólogo da história eclesiástica; e de igual modo não o exalta além da
mediada, o que faz dessa obra algo bastante interessante. Na obra fica claro o
propósito era trazer de forma sintética, específica e dentro de uma unidade de
pensamento, os principais aspectos da vida e obra de João Calvino, e ele faz
isso com eficiência e clareza.
A obra é indicada para todos aqueles desejam ter um resumo da vida e obra
deste grande reformador genebrino. Ela é uma ótima ferramenta para o
entendimento da matéria. Por isso, para todos estudiosos e interessados em
conhecer a cosmovisão de Calvino dentro de seu contexto socioeconômico, este é
um livro que não pode faltar na biblioteca.
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